segunda-feira, 15 de junho de 2015

Pelo Tempo: "Jeff Wall – Uma Rajada Intelectual" (2011-08-07)

 

Tento aproveitar esta oportunidade para abordar temas obviamente do meu interesse, como arte, cultura e comunicação em geral, com alguns laivos à sociedade e à política…
Acho importante a presença destes temas no dia a dia das pessoas, sendo mesmo minha convicção que a arte é um dos principais impulsionadores de um verdadeiro desenvolvimento social sustentável, equilibrado e civilizado.
Assim, e numa perspetiva local, tento quando possível, que o teor deste espaço seja regional ou nacional… que não é o caso de hoje.
Há muito que tenho desejo de escrever sobre Jeff Wall, mesmo sendo difícil definir, mas deve ser o meu fotógrafo preferido. Tenho outros, nacionais e internacionais, mas este marcou-me particularmente, talvez por tenha sido através das suas imagens que comecei a aprender sobre fotografia contemporânea.
Nascido em 1946 no Canadá, desde os anos 60 e 70 que se tornou uma das principais figuras da cena artística de Vancouver, cuja escola ajudou a definir através de vários trabalhos escritos de relativa importância. Está sempre muito presente esta cidade no seu trabalho, misturando a sua beleza natural, e decadência urbana e mesmo moral.
Estudou na Universidade de British Columbia e no Courtauld Institute, e depois deu aulas em várias universidades e institutos, assim como publicou outros importantes ensaios sobre fotografia e arte sobre com vários artistas de renome internacional. Entre os vários prémios que já recebeu, destaque para o Hasselblad Award, reconhecido prémio de uma academia sueca em fotografia.
Enquanto estudante, o seu trabalho foi bastante experimental e conceptual, como se deseja num jovem, mas só em 1977 produziu o que se pode definir como as suas primeiras “foto transparências retro iluminadas”, pelo que ficou conhecido mundialmente, geralmente encenadas e referindo-se a problemas da história da arte e filosofia.
Embora seja praticamente impossível referir apenas alguns trabalhos de Jeff Wall, gostaria de destacar “Mimic” (1982), que desmonta o seu estilo cinematográfico: um casal branco e um indivíduo asiático, ambos de frente para a câmara, num ambiente norte-americano suburbano, onde o homem branco, num gesto de troça e racista, levanta com o dedo o canto superior do seu olho, simulando os olhos orientais. No que parece uma fotografia casual, muito trabalho e técnicos foram utilizados, para conseguir naquele momento representar o que Wall desejava, ou seja, aquela tensão social implícita, que afinal se baseava num gesto que o artista tinha mesmo presenciado.
Uma das suas imagens mais conhecidas deve-se ao facto de a banda norte-americana Sonic Youth a ter escolhido para o álbum “The Destroyed Room: B-sides and rarities”, de 2006, uma importante coletânea para os seus fãs. A fotografia, de 1978, deu mesmo origem ao nome do álbum, de extrema importância para o futuro trabalho de Jeff Wall, como que um manifesto contextualizado de revolta e agressão à vida doméstica, ao bom estilo punk académico dos Sonic Youth.
Jeff Wall pretende aperfeiçoar a “arte de não fotografar”, ou seja, procurar as imagens que se escondem numa cidade, e depois a partir delas construir momentos ficcionados para capturar novamente em câmara. E isto é literalmente uma mistura de performance e realidade, em que a fotografia de Jeff Wall se move.
As suas fotografias são cuidadosamente pensadas e ensaiadas, partilhando técnicas e pensamentos do cinema e da pintura, criando um conjunto de imagens que derivam dessas duas técnicas.
Outro exemplo, a finalizar, e uma das minhas peças de referência, é o trabalho “A Sudden Gust of Wind (after Hokusai)”, de 1993, atualmente parte integrante da Tate Gallery. Trata-se de uma transparência das já referidas, com 2,2 x 3,3 metros. Grande e luminosa. É baseada numa xilogravura do artista japonês Katsushika Hokusai, de 1831, que representa a época dos tufões e retrata um grupo de viajantes lutando contra os fortes ventos, agarrando-se aos seus chapéus e haveres.
Jeff Wall transplantou essa imagem para a sua Vancouver, e demonstra um grupo de personagens apanhados desprevenidos por uma súbita rajada, levando um chapéu e muitos papéis pelo ar. O trabalho foi construído a partir de 50 imagens, tiradas ao longo do ano, que depois foram digitalizadas e processadas, quase como na produção de um filme, mas trata-se “apenas” de uma fotografia… isto é Jeff Wall.


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