quarta-feira, 9 de abril de 2014

Pelo Tempo: "Fernando Lopes: a luta continua" (2012-06-05)

Já se sabe que quando alguém morre, surgem logo a falar bem do seu trabalho, da sua personalidade, da boa pessoa que era… e foi o que sucedeu com o desaparecimento de Fernando Lopes, um dos grandes realizadores portugueses, também conhecido pela sua paixão, sinceridade, ser um bon vivant e um amante de Lisboa.
Fernando Lopes estudou Realização de Cinema no London Film School em 1959, enquanto trabalhava na RTP. Após o seu regresso a Portugal, filma algumas curta-metragens documentais e de ficção, e com a sua primeira longa-metragem, cria um mito, com o documentário Belarmino (1964). Considerado um dos principais trabalhos do Novo Cinema português, movimento vanguardista que rompeu com a ideologia do Estado Novo vigente na época, juntamente com António Pedro Vasconcelos, José Fonseca e Costa e outros.
O filme segue a vida de um pugilista português, Belarmino, numa ótica neo-realista, com nítidas preocupações sociais, num cinema direto e com recurso à entrevista. Juntamente com Uma Abelha na Chuva (1971) e O Delfim (2002) são as suas obras mais marcantes e conhecidas do público português.
Publicamente reconhecido pelos seus pares, talvez o melhor prémio de uma vida dedicada à promoção e defesa da ética no cinema, tornou-se uma figura conhecida e acarinhada do público português, tendo sido ainda fundador e diretor da RTP2 e professor universitário.
O seu mais recente filme, Em Câmara Lenta (2012), estreou em Março deste ano, e seria já uma antecipação da sua partida, uma despedida triste, em contraponto com tanta felicidade que colocou nos seus filmes. Trata-se de um filme sobre o revisitar da vida de um homem, com os inevitáveis “quem sou eu” e “como vivi a minha vida”.
Mas Fernando Lopes era também um ativista atento às causas do cinema, e geralmente queixava-se dos meios de produção em Portugal, dizendo mesmo ser necessária uma “Nova Vaga”, facilitando os meios para se fazer cinema.
E esse espírito de luta em defesa do cinema continuará, como tem vindo a ser noticiado, pelo facto de um grupo de realizadores e produtores nacionais se terem reunido no Cinema São Jorge, a exigirem ser recebidos pelo Primeiro-ministro, com vista a que seja cumprido o prazo de aprovação da nova Lei do Cinema. Isto tudo na mesma altura em que o filme de Gonçalo Tocha sobre a ilha do Corvo (a exibir brevemente em Angra e Praia), ganhou mais um prémio, desta vez no Festival de São Francisco.
O cinema português vive um momento de reconhecimento internacional, que deve ser capitalizado, mas infelizmente isso não significa que existam grandes expectativas para o futuro. Com o ICA (Instituto de Cinema e Audiovisuais) praticamente falido, e muitos profissionais do sector sem receberem os apoios já concedidos, o cinema encontra-se parado.
Bem sei que em altura de crise a arte e a cultura podem não ser o que mais interessa, mas se pensarmos bem, e relembrando uma máxima de Winston Churchill, se não lutarmos pela nossa cultura, então lutamos porquê?

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