quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Arte e intervenção social (2010-12-23)

Uma vez por mês a empresa municipal Culturangra organiza uma sessão de cinema com o intuito de provocar um espaço de discussão e conversa sobre temas actuais, na área da cultura, ambiente ou sociedade.
No fim do mês de Novembro realizou-se uma sessão com a exibição do filme “Um Sonho Impossível” (“The Blind Side” no original em inglês), que conta a história de um jovem atleta de futebol americano e da família que o apoiou. O filme baseia-se então na incrível história de vida do jovem Michael Oher, assim como da atitude assertiva e vencedora da mulher de negócios Leigh Anne Tuhoy.
Enquanto filme, “Um Sonho Impossível” é relativamente insípido, simples e sem grande profundidade, com um tradicional “fim feliz” como tão bem Hollywood nos habituou – reconfortante para a alma. Deu o Óscar de melhor actriz a Sandra Bullock, provavelmente pela carreira mais do que por este papel, mas são as politiquices na indústria cinematográfica – enfim, o filme estava destinado a ser dominado pela presença da actriz, o que não tira valor ao cerne da questão.
Baseado numa história verídica, temos Michael Oher (representado pelo desconhecido Quinton Aaron), um jovem afro-americano de 17 anos, que andou por várias famílias de acolhimento, sendo originário de um ambiente muito hostil, com pais alcoólicos e toxicodependentes e mais 12 irmãos. Devido ao seu grande atleticismo, e à amizade de um vizinho, consegue entrar para uma boa escola, fazendo valer os seus 1,93 metros e 140 quilos!
Sempre dormindo em casa de amigos, ou procurando abrigo em locais quentes, chegando por vezes a ficar ao relento, chama a atenção de Leigh Anne Tuhoy, típica senhora rica de famílias aristocráticas sulistas, que lhe dá guarida, e acima de tudo, companhia, carinho e estímulo.
Posteriormente, e após se ter criado uma rápida relação com todos os elementos da família, decidem tornar-se guardiões legais de Michael, ajudando-o na escola e iniciando-o no futebol americano, desporto de grande impacto nos Estados Unidos. Com todo o apoio e ajuda da família, integração escolar e uma visão de futuro, Michael tornou-se um grande jogador, tendo seguido uma brilhante carreira universitária, e sendo actualmente um dos melhores jogadores profissionais de futebol americano.
Mas lá aparece finalmente a questão, pois tendo tido críticas mistas, e mesmo tendo atingido um interessante valor de receitas de bilheteira de 250 milhões de dólares americanos, não será um filme a recordar. Marcante é de facto a história que nos dá a conhecer, sem esquecer a importante postura pela família que acolheu Michael, numa sociedade fortemente conservadora e racista, a capacidade de sobrevivência de uma criança a tanta provação.
Utiliza-se actualmente um termo, originário da Física, que acho que se enquadra perfeitamente no que pretendo destacar: resiliência. A psicologia impregnou esse termo de um valor emotivo muito curioso, apresentando-o como a “capacidade de um indivíduo lidar com problemas, superara obstáculos ou resistir á pressão de situações adversas, sem entrar em surto psicológico”, como nos aparece explicado no sítio da Wikipedia. É de facto incrível o que aquele jovem passou durante a sua breve vida, como muitas outras crianças em todo o mundo, e se de facto nos sensibiliza a existência de tanta desgraça, deve-nos impressionar a capacidade e resistência existentes nesses pequenos corações.
Assim, e mesmo sem ser um grande exemplar criativo, temos a arte a transmitir uma mensagem de esperança e crença no futuro, tendo por base a solidariedade e coragem humana.
Outra abordagem a temáticas de cariz social surge em dois eventos a decorrer na ilha Terceira, numa organização da Associação Cultural Burra de Milho, promovida pela Direcção Regional de Igualdade de Oportunidades: o ciclo de cinema “Exclusão Social” e a exposição de pintura e literatura “Palavras Pintadas – a violência nas mulheres”.
O ciclo de cinema, de cariz documental, decorre no Auditório Ramo Grande, entre 27 de Novembro e 11 de Dezembro, e apresenta filmes subordinados à temática da Pobreza e da Exclusão Social, segundo diversos olhares e perspectivas, distribuídos por três Sábados, pelas 18h00, sendo que o destaque vai para a apresentação do documentário “Lisboetas”, pelas 21h00 do dia 11. De destacar também a colaboração do programa Europe Direct, que contribui com a cedência de várias curtas-metragens sobre a temática, a exibir antes das longas-metragens.
Em relação à exposição, que se baseia no mesmo protocolo assinado entre as entidades referidas, e como forma de assinalar o Dia Internacional da Erradicação da Violência contra as Mulheres, resulta de um trabalho conjunto entre a escritora Sónia Bettencourt e a artista plástica Phillipa Cardoso. A exposição foi inaugurada no dia 25 de Novembro, na Academia de Juventude da Ilha Terceira, e encontra-se patente até ao dia 31 de Dezembro.
Aqui fica um exemplo claro da importância do papel da arte e da criatividade no desenvolvimento da nossa sociedade, por vezes relegada a um papel de pouca importância em tempos de crise, mas um verdadeiro sustentáculo da coragem humana!

in Diário Insular, 2010-12-23



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