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A discussão em torno das indústrias culturais e criativas começa
agora a estar mais acesa nos Açores. No entanto, a aposta neste
setor – também económico! – é ainda bastante residual. O que é
que falta, na sua opinião, para que haja nos Açores um efetivo
desenvolvimento destas indústrias?
Num
conceito atual de Indústrias Culturais e Criativas (ICC), temos uma
combinação de situações, onde a criatividade é condição
nuclear para o negócio, sendo no entanto a sua origem cada vez mais
vocacionada para a inovação, competências e talento individual,
potenciando assim a criação de trabalho e riqueza, numa época tão
complexa e de crise como os dias de hoje, valorizando a propriedade
intelectual. Partindo
dessa definição objetiva e simplista, sempre
houve na região vários exemplos de ICC de sucesso, como editoras,
galerias de arte ou ateliês de arquitetura. Na minha opinião, o que
se passa atualmente na região é essas empresas não conseguem obter
valorização por parte da sociedade, tendo grandes dificuldades para
se imporem. É observável uma falta de experiência profissional,
pois trata-se de um setor em que os profissionais são muito jovens e
recentemente licenciados. Por outro lado é notória a falta de
conhecimento em questões de gestão financeira e estratégica de
comunicação – talvez os aspetos fundamentais a trabalhar
atualmente.
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Será, aliás, realista pensar na criação de um setor de indústrias
culturais e criativas nos Açores? As dificuldades decorrentes da
insularidade podem dificultar este processo?
Como
referi, o setor já existe, e fortemente influenciado pela
insularidade, como toda a nossa sociedade – ou até se calhar
menos, pois estamos a falar de uma área com uma forte componente
tecnológica, estando atualmente o mundo todo ligado. O problema da
distância talvez se observe mais no facto de não se poder reunir
pessoalmente com alguns clientes ou parceiros. Por outro lado, num
hipotético projeto em rede ao nível regional, são várias as
experiências que demonstram que tal ainda não é possível, pois as
ilhas ainda estão muito viradas para dentro. Ainda numa terceira
perspetiva, e assumindo as dificuldades decorrentes desta nossa
localização e distribuição geográfica, é de salientar o papel
das autarquias, pois poderão potenciar muitos projetos a nível
local, e mesmo de cariz intermunicipal.
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Qual tem sido o papel dos agentes culturais da Região no sentido de
clarificar este conceito e de impulsionar o desenvolvimento deste
setor?
Nos
últimos anos muitos projetos que provavelmente seriam catalogados de
“apenas artísticos”, embarcaram em aventuras empresariais,
passando assim a estarem claramente englobados neste setor económico
das ICC. Não existe aqui problema nenhum, aliás, quanto mais
criativo e original, melhor correrá o projeto, e mais forte será a
sua identidade. Na região o papel dos agentes culturais tem sido
então muito importante, pois é um setor com sensibilidade para
estas questões, e acaba muitas vezes por ser o principal cliente e
parceiro dos profissionais da área. Não existindo quem faça uma
mediação entre o trabalho artístico e um projeto de gestão,
acabamos muita vez por sentir necessidade de ter um certo papel de
consultoria e apoio a muitos jovens que nos procuram.
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As instituições e o Estado tiveram e têm, no continente, um papel
central na dinamização das indústrias culturais. Qual terá de
ser, nos Açores, a estratégia a adotar? Universidade e Governo
Regional serão dois pilares essenciais neste domínio?
Acho
que sim. Mesmo abordando um setor onde a iniciativa privada e o
empreendedorismo são as palavras-chave, acredito que pode existir
espaço para uma entidade, de cariz associativo (privado ou público),
que sirva de complemento às atividades de gestão e comunicação
das várias ICC, agindo como uma plataforma de informação
legislativa, divulgação de atividades, apoio técnico e mesmo
representatividade. Além do Governo e da Universidade, devemos
acrescentar um conjunto alargado de agentes culturais, câmaras do
comércio e indústria e as autarquias, principalmente se inserirmos
na discussão a importância das incubadoras de ICC, como serve a
região Norte do país de bom exemplo.
Nota:
Entrevista ao Diário Insular, 2015-05-30
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